Por
Claudio Caterinque
Repórter
É fato que as tecnologias de comunicação avançam na velocidade da luz, numa referência à fibra ótica, e, por este motivo, deixam pelo caminho sistemas que, atualmente, já são considerados obsoletos, como é o caso da telefonia fixa. Nesta Reportagem Especial, a Rede TC de Comunicações mostra o perfil desta evolução, o que evidencia que estamos prestes a observar o fim de uma era. Com as mudanças nas regras de concessão no final deste ano, a telefonia fixa pode estar com os dias contados.
No ano ado, a partir da Lei Geral de Telecomunicações (LGT) aprovada em 2019, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) aprovou uma norma que inclui regras mais flexíveis para os serviços de telefonia fixa no Brasil, migrando do atual modelo de concessão para o de autorização.
Os atuais contratos têm validade até 31 de dezembro de 2025. A grosso modo, a norma aprovada pela Anatel desobriga as concessionárias de oferecer o serviço de telefonia fixa em determinadas áreas a partir de 1º de janeiro de 2026.
Isso significa que o País está em transição para um modelo em que a telefonia fixa seja substituída pela telefonia móvel em grande parte do território. Assim, as operadoras podem, em algumas situações, substituir a infraestrutura de telefonia fixa –cabos metálicos– por tecnologia móvel.
E essas mudanças já começaram a ser observadas com cada vez menos linhas de telefone fixo e um aumento quase que exponencial da telefonia móvel. Tanto é que atualmente o Brasil possui mais linhas de telefone móvel do que número de habitantes, conforme dados da própria Anatel.
Tecnologia fixa x móvel
De acordo com os dados apresentados à Rede TC de Comunicações pela Anatel, é visível o processo de substituição da telefonia fixa por móvel ao longo dos últimos anos. Em São Mateus, por exemplo, em janeiro de 2010 haviam 11.334 os de linhas telefônicas fixas no Município.
Apesar de a quantidade ter diminuído para 7.578 em janeiro deste ano, os dados mostram que houve um aumento no número de instalações a partir de 2022. A quantidade mínima de os a telefones fixos em São Mateus foi registrada em outubro de 2021, quando atingiu 4.802 linhas. A Anatel explica que isso ocorre devido ao crescimento da banda larga residencial, com algumas operadoras comercializando o serviço num pacote que inclui linhas fixas. Analisando os dados da Agência, essa tendência é observada apenas em relação aos números do Município.
No Espírito Santo, em janeiro de 2010 eram 718.215 linhas fixas instaladas em todo o Estado. Em janeiro deste ano haviam 376.817, uma queda de 47,53%. E no Brasil, a quantidade de linhas fixas instaladas caiu de 40,366 milhões em 2010 para 22,324 milhões em 2025.
CELULAR
Por outro lado, houve uma explosão na quantidade de linhas móveis no Brasil, no Espírito Santo e em São Mateus desde 2010. Conforme os dados da Anatel, o País detinha 175,6 milhões de linhas em janeiro de 2010. No mesmo mês em 2025, a quantidade subiu para 264 milhões, mais que a população total do Brasil, de 212.583.750 habitantes, segundo estimativa habitacional apresentada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 1º de julho de 2024.
No Espírito Santo, houve movimento crescente semelhante, partindo de 3,4 milhões de linhas em 2010 para 4,9 milhões neste ano, número também superior à população do Estado, de 4.102.129 pessoas.
Já em São Mateus, os dados apresentados pela Anatel são a partir de 2019. Desta forma, em janeiro daquele ano o Município registrava um total de 92.531 linhas móveis. Em janeiro deste ano a quantidade subiu para 151.367 linhas, mais que a estimativa populacional do IBGE, que é de 133.359 habitantes.
Orelhão virou artigo de museu
Muito popular nas décadas adas, com ficha ou os mais modernos cartões, os telefones de uso público (TUP), mais conhecidos como orelhões, são raros de encontrar hoje em dia e, agora, se tornaram artigos de museu. De acordo com a Anatel, em São Mateus cinco aparelhos constam como ativos. No entanto, a Agência não informou a localização deles. Com isso, a comprovação do funcionamento ficou prejudicada.
Para se ter uma ideia, em 2007, há menos de 20 anos, São Mateus possuía 463 telefones orelhões, segundo dados da Anatel.

Foto: Júnior Eler/Divulgação
A Reportagem conseguiu localizar um aparelho em Guriri, no lado norte, próximo ao Tamar. Há também outros aparelhos na cidade, na Avenida Jones dos Santos Neves ao lado de um ponto de ônibus defronte ao Mercado Municipal, no Bairro Sernamby, próximo ao antigo campo do Mateense, e no Bairro Colina. Todos os aparelhos verificados estão desativados, com sinais de abandono e marcas de depredação.
Segundo a Anatel, em todo o Estado, há 76 orelhões com status de ativo, incluindo os que constam em São Mateus, sendo 75 da operadora Oi e um da Claro.
A Anatel esclarece ainda que, devido à mudança recente do sistema de coleta desses dados, as informações sobre os orelhões encontram-se temporariamente indisponíveis. “A Anatel vem envidando esforços para sanar essa indisponibilidade o mais rápido possível” – complementa a Agência.
Prefeituras relatam dificuldades em manter linhas fixas em órgãos
Já há algum tempo é comum ouvir cidadão reclamando que não consegue contato por meio de telefone fixo com algum órgão público. Especificamente em alguns municípios do Norte do Estado, a reclamação recorrente é em relação às prefeituras. A Reportagem buscou reunir dados sobre o funcionamento de linhas telefônicas fixas em órgãos municipais e constatou que há essa dificuldade.
SÃO MATEUS
Em São Mateus as linhas de telefonia fixa não estão funcionando já há algum tempo, segundo o secretário de Ciência e Tecnologia, Ricardo Hoffmann Neto. Ele esclarece que, atualmente, a Prefeitura disponibiliza o contato da Ouvidoria, por meio do telefone móvel (27) 9.9974.7171, que recebe mensagens por aplicativo de texto.
“No entanto, já está em andamento um processo para contratação de um sistema de telefonia com PABX em nuvem, que será implantada no Centro istrativo. Ainda não há uma previsão de datas, mas o processo já está em tramitação” – garante.
MONTANHA
As linhas de telefone fixo da Prefeitura de Montanha também não estão funcionando. Em resposta, a Secretaria de Comunicação afirma que “o não funcionamento se deve ao fato de que as linhas foram canceladas durante a gestão anterior devido aos débitos deixados” e que “a atual gestão está trabalhando na quitação dessas dívidas para, em seguida, regularizar a situação e viabilizar novas aquisições”. A pasta afirma que o contato deve ser feito por meio do aplicativo Conecta Montanha.
PEDRO CANÁRIO
Em resposta, a Secretaria de Comunicação da Prefeitura de Pedro Canário afirma que existem linhas telefônicas fixas disponíveis no gabinete do prefeito e também em todas as secretarias municipais. “Além dos telefones fixos, a gestão municipal mantém canais de comunicação direta com a população por meio de números de celular institucionalizados, que também estão disponíveis via aplicativos de mensagens”.
OUTRAS
A Reportagem também solicitou informações para as prefeituras de Jaguaré, Conceição da Barra, Boa Esperança e Pinheiros, mas até o fechamento desta matéria não houve retorno.
Telefone fixo ainda é o principal meio de comunicação em locais isolados, aponta especialista
Com participação ativa na implantação de projetos 5G no Espírito Santo e ainda de olho no 6G, o especialista em telecomunicação, Matheus Oggioni Lima Beninca, afirma que a mudança da telefonia fixa como conhecemos para a móvel não é simplesmente uma virada de chave, uma substituição de equipamentos. Ele explica que o Brasil é um dos países que tem o maior número de aparelhos móveis por habitante e que o o à internet realmente alcança altos níveis, mesmo que parte da população ainda tenha dificuldade no uso da tecnologia.

Foto: Claudio Caterinque/TC Digital e Raiana Louredo/Divulgação
Subsecretário de Projetos Integrados da Secretaria Estadual de Ciência e Tecnologia, Matheus Beninca observa que é preciso avaliar quem pode ser prejudicado se a linha fixa chegar ao fim “pensando em populações mais afastadas”. Segundo ele, a telefonia móvel já alcança todos os municípios capixabas, mas ainda há localidades que utilizam linhas fixas, que ele chama como zona de sombra.
“E isso vale para o Espírito Santo e vale para vários estados. A cobertura de o às telecomunicações é um desafio para o Brasil. Sempre foi e continua sendo. Por isso que é importante também trazer esse debate para a sociedade, entender o quanto os legisladores, os gestores públicos, estão cientes dessa transformação e quem vai ser impactado de fato” – observa.

Foto: Secti/Divulgação
Segundo ele, quem potencialmente será impactado são as pessoas menos ativas nos meios digitais. “De fato, percebe-se que o a telefonia fixa está desaparecendo porque o custo da comunicação ficou muito baixo. A estrutura para manter esses aparelhos [fixos] é muito maior. Agora, com a internet, com tudo digitalizado. A gente faz a ligação usando pacote de dados, Wi-Fi, e nem lembra da conta de telefone mais. Há 15 anos, qualquer ligação você ficava preocupado com a conta de telefone, quantos minutos ligou. Isso deixou de ser uma preocupação para uma boa parte da população” – pontua o subsecretário.
Alternativas ao telefone fixo
Para Matheus Beninca, antigamente era comum as praças terem o telefone orelhão. Atualmente, ele aponta que a alternativa, em algumas cidades, é oferecer o público à internet nesses locais. “O ponto com um aparelho fixo numa praça pública atende quantas pessoas? Agora, com um ponto Wi-Fi público, quantas mais pessoas consegue atender? E aí você dá o a múltiplos meios de comunicação”.
Para além de oferecer o à internet gratuita, o especialista observa que é preciso também ofertar algum programa de alfabetização digital. “Para a pessoa se ambientar e não ficar vulnerável a golpes, por exemplos, não investir todo o seu tempo em coisas que não vão te trazer nenhum conforto, nenhum retorno. E aí vem os outros problemas da sociedade digital” – salienta.
Segundo Matheus Beninca, a estrutura do Governo do Estado ainda usa a telefonia fixa. “Para as repartições públicas, secretarias de governo. Além disso, temos um conjunto de telefones que são exclusivos do Estado que utilizam a telefonia fixa, como os atendimentos de urgência e emergência com 182, 190, 181, 192 e outros”.
Foto do destaque: Claudio Caterinque/TC Digital e Raiana Louredo/Divulgação